A dificuldade de engravidar ainda é tabu? - Studio Pipoca

A dificuldade de engravidar ainda é tabu?

Para muitas mulheres o sonho de ser mãe esbarra em barreiras biológicas. Enquanto a infertilidade ainda é tabu, a medicina avança na reprodução assistida.

Enquanto muitas mulheres optam por não ser mãe, outras sofrem com a impossibilidade de ter filhos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) a infertilidade afeta de 50 a 80 milhões de pessoas no mundo, sendo que no Brasil cerca de 8 milhões de indivíduos podem ser inférteis. Para quem nutre o desejo de ter filhos, lidar com a frustração de não conseguir engravidar naturalmente é difícil. Esse sentimento ainda é agravado pelo julgamento social – mesmo que silencioso –onde a infertilidade é vista como sinônimo de fracasso. 

Embora hoje a medicina seja capaz de ofertar uma série de técnicas e soluções para resolver o problema e alcançar a gestação, essas não funcionam para todas as mulheres. Aquelas que passam por procedimentos sem resultados sofrem com os sentimentos de vergonha, solidão, tristeza e não raro desenvolvem a depressão. Mudar essa realidade exige exercitarmos outro olhar sobre a questão, removendo o tabu sobre a incapacidade biológica de ter filhos e construindo redes de apoio voltadas as mulheres – e porque não, homens – que vivem com a infertilidade.

A infertilidade: tentando entender alguns motivos

As grandes transformações pelas quais o mundo passou nas últimas décadas transformou o perfil das mães. Se anteriormente foi comum que mulheres engravidassem antes dos trintas anos, hoje a realidade é bem diferente. Levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou que, entre 2008 e 2018, o número de crianças nascidas de mulheres com menos de 30 anos diminui 16,1%. Em contrapartida, no mesmo período, registrou-se um aumento de 36% dos nascimentos para mães entre 30 e os 44 anos. São diversos os motivos que levaram a essa mudança, como o aumento do custo de vida, o maior acesso a informação sobre prevenção a gravidez e planejamento familiar, a maior inserção da mulher no mercado de trabalho e aumento da dedicação à carreira, entre outros.

E o que isso tem a ver com infertilidade? Oras a idade é um fator determinante para a fertilidade das mulheres. Com o passar do tempo à produção de óvulos diminui e apresenta queda de qualidade, minando a capacidade reprodutiva. Além disso, o envelhecimento provoca a irregularidade do ciclo menstrual e o afinamento do endométrio. Vale lembrar que estimativas apontam que mesmo um casal jovem sendo saudável e mantendo relações sexuais regulares sem o uso de contraceptivos, a chance de engravidar é em torno de 20%. A irregularidade do ciclo menstrual e maior dificuldade na capacidade de fixação do embrião no endométrio tornam as chances ainda mais baixas. Essa situação é extremamente frustrante para muitas mulheres que adiam o desejo de ser mãe na busca de uma vida mais estável e confortável, e quando finalmente acreditam ter chegado o momento certo de terem filhos, enfrentam dificuldades.

Além do envelhecimento outros motivos que podem levar a infertilidade em mulheres são:

  • Distúrbios hormonais;
  • Síndrome dos ovários policísticos;
  • Problemas nas trompas ou tubas uterinas;
  • Endometriose;
  • Infecção no colo do útero;
  • Muco cervical que impede a passagem do espermatozoide.

Antes de iniciar as tentativas de engravidar é importante que a mulher converse com seu ginecologista para garantir que está tudo bem com a sua saúde reprodutiva. Caso não existam problemas, o casal deve tentar a gravidez por 12 meses antes de avaliar a infertilidade. Para mulheres acima de 35 anos a OMS recomendo que esse prazo seja de seis meses. É importante reforçar que atualmente é estimado que 35% dos casos de infertilidade em casais estão relacionados a mulheres, mesmo índice entre os homens, sendo que em 20% dos casais o problema atinge ambos. Além disso, em 10% dos casos de infertilidade em casais as causas são desconhecidas.

Esses dados são importantes para que a mulher não caia em um mar de culpa, como se o fato de não conseguir engravidar fizesse dela um pária ou um fracasso. Moralizar a questão não nos serve de nada. O fenômeno é comum e atinge homens e mulheres na mesma proporção, então levanta essa cabeça que felizmente hoje a reprodução assistida evoluiu muito!

Os tratamentos contra a infertilidade

A infertilidade gera sofrimento emocional e julgamento social para as mulheres, muito em parte devido à manutenção de uma crença, mesmo que inconsciente, de que um dos objetivos de estarmos nesse mundo é a reprodução. “Crescei-vos e multiplicai-vos” é uma das frases mais conhecidas da bíblia, mostrando o papel da religião na consolidação dessa visão. Está tudo bem não ser mãe. Se você não consegue engravidar, isso não quer dizer que você falhou como ser humano. A maternidade é apenas uma das esferas da vida. Mas se mesmo sabendo disso você nutre um forte desejo interno de ser mãe, a boa notícia é que a medicina reprodutiva avançou muito! Hoje existe uma série de tratamentos que apresentam boas chances de sucesso na gestação. Abaixo separamos os principais deles:

- Indução de ovulação com namoro programado: tratamento indicado para mulheres com distúrbios na ovulação. São utilizados hormônios que estimulam a produção de óvulos no período fértil, que deve coincidir com o namoro programado nesse período.

- Inseminação Intrauterina: o médico transfere espermatozóides previamente tratados e selecionados em laboratório para o útero. É indicado em casos de distúrbios da ovulação, endometriose leve e alterações seminais discretas. A taxa de sucesso varia conforme a idade da mulher, mas sempre inferior a 20% em cada ciclo.

- Fertilização in vitro convencional: São retirados óvulos que então são colocados em uma cultura com a presença de espermatozóides para que ocorra a fecundação espontânea. São selecionados melhores óvulos fecundados para transferência para o útero ou congelamento. Nesse método as chances de gravidez são de 60%. A idade da mulher também influi no sucesso.

- Mini fertilização in vitro: o método é o mesmo da fertilização in vitro convencional, com a diferença que são aplicadas doses mais baixas de hormônio, o que resulta em um menor número de óvulos produzidos, mas também menor custo para a paciente.

- Doação de óvulos: quando a mulher não é mais capaz de produzir óvulos ou quando as tentativas de outros tratamentos forem mal sucedidas, a doação de óvulos é uma alternativa. Após a obtenção dos óvulos junto a doadoras, o procedimento segue o padrão da fertilização in vitro. A taxa de sucesso é de 60% por transferência embrionária.

Você pode saber mais sobre os tratamentos no site da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida.

A desigualdade, a infertilidade e a necessidade de grupos de apoio

Embora o Brasil seja o país líder em processos de reprodução assistida na américa latina, a realidade é que os tratamentos ainda são caros. Diante da enorme desigualdade no país, muitas mulheres não contam com o privilégio de recorrer a essas tentativas para realizar o sonho de ser mãe. É importante reforçar que mesmo com a evolução dos tratamentos não há garantia total de sucesso, fazendo deles um investimento de risco, em especial para quem não possui grandes reservas financeiras. Essa situação piorou com a pandemia do Covid-19. Por conta da nova doença tratamentos de fertilidade em andamento tiveram que ser suspensos. Assim, mulheres que haviam utilizado suas economias para buscar o sonho de ser mãe enfrentam a incerteza com o futuro.

Quem não conta com condições de recorrer à reprodução assistida ou não obtém os resultados desejados ao realizar os tratamentos, acabam carregando o peso de se sentir infértil, com consequências emocionais que podem ser severas. A frustração pelo fim do sonho de ser mãe é capaz de levar a depressão e outros transtornos. 

Diante disso é urgente a mudança de olhar sobre a questão, com a formação de grupos e redes de apoio voltado às mulheres inférteis, onde elas possam encontrar outras que passam pela mesma situação e assim se fortalecer juntas. Recomendamos o podcast do coletivo "uma vida mais fértil" que fala sobre infertilidade, e os perfis "infertilidade sem censura" e "lutar pela fertilidade" que desmistificam esse assunto. É importante também lembrar que existem psicólogos especialistas em infertilidade, e eles podem ajudar quem está passando por  esse momento.

Precisamos mudar essa visão de a fertilidade e a maternidade é a nossa grande missão na vida. As mulheres são seres cheios de potência e que podem se realizar de outras formas. Para que essa mudança ocorra a sororidade é fundamental. Não julgue mulheres que sofrem com a infertilidade, pratiquem a empatia, e não alimente essa visão minúscula sobre nosso papel no mundo. Juntas podemos tirar o peso que essa questão faz em nossos ombros.

Se você não consegue ser mãe de forma natural ou mesmo com o uso da reprodução assistida, está tudo bem! Você não é menos mulher por isso e ainda pode ser feliz de muitas outras formas!

Vamos juntas desconstruir o tabu da infertilidade?

Vamos abrir a conversa sobre outros temas que ainda são considerados tabus? Confira nossos posts sobre a escolha de não ser mãe e aborto espontâneo. É com o diálogo e informação que a gente avança!

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